6 de jun. de 2010

História 3

As coisas que a gente fala



As palavras podem nos parecer duras, suaves, feias, bonitas, tristes, alegres... Elas expressam tanto as verdades quanto as mentiras. Portanto, as palavras devem ser bem dimensionadas antes de serem ditas, senão elas podem causar uma tremenda confusão!
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As coisas que a gente fala saem da boca da gente e vão voando, voando, correndo sempre pra frente.
Entrando pelos ouvidos de quem estiver presente.
Quando a pessoa presente é pessoa distraída, não presta muita atenção, então as palavras entram e saem pelo outro lado, sem fazer complicação.
Mas às vezes as palavras vão entrando nas cabeças, vão dando voltas e voltas, fazendo reviravoltas e vão dando piruetas.
Quando saem pela boca, saem todas enfeitadas, engraçadas, diferentes, com palavras penduradas.
E depois que elas se espalham, por mais que a gente procure, por mais que a gente recolha, sempre fica uma palavra, voando como uma folha, caindo pelos quintais, pousando pelos telhados, entrando pelas janelas, pendurada nos beirais.
Por isso, quando falamos, temos de tomar cuidado.
Que as coisas que a gente fala vão voando, vão voando, e ficam por todo lado.
E até mesmo modificam o que era nosso recado.

Eu vou contar pra vocês o que foi que aconteceu, no dia em que a Gabriela quebrou o vaso da mãe dela e acusou o Filisteu.
- Quem foi que quebrou meu vaso? Meu vaso de ouro e laquê, que eu conquistei no concurso, no concurso de crochê? Quem foi que quebrou seu vaso?
A Gabriela respondeu:
- quem quebrou seu vaso foi... o vizinho, o Filisteu.
Pronto! Lá vão as palavras!
Vão voando, vão voando... entrando pelos ouvidos de quem estiver passando.
Então entram pelo ouvido de dona Felicidade:
- o Filisteu? Que bandido! Que irresponsabilidade!
As palavras continuam a voar pela cidade.
Vão entrando nos ouvidos de gente de toda idade.
E aquilo que era mentira, até parece verdade...
Seu Golias, que é vizinho de dona Felicidade, e que é o pai do Filisteu, ao ouvir que o filho seu cometeu barbaridade, fica danado da vida, inventa logo um castigo, sem tamanho, sem medida!
Não tem mais festa!
Não tem mais coca-cola!
Não tem TV!
Não tem jogo de bola!
Trote no telefone?
Nem mais pensar!
Isqueite? Milquicheique??
Vão acabar!
Filisteu, que já sabia do que tinha acontecido, ficou muito chateado!
Ficou muito aborrecido!
E correu logo pro lado, pra casa de Gabriela:
- Que papelão você fez! Me deixou em mal estado, com essa mentira louca correndo por todo lado.
Você tem que dar um jeito! Recolher essa mentira que me deixa atrapalhado!
Gabriela era levada, mas sabia compreender as coisas que a gente pode e as que não pode fazer; e a confusão que ela armou, saiu para resolver.
Gabriela foi andando.
E as mentiras que ela achava na sacola ia guardando.
Mas cada vez mais mentiras o vento ia carregando...
Gabriela encheu sacola, bolsa de fecho de mola, mala, malinha, maleta.
E quanto mais ia enchendo, mais mentiras ia vendo, voando, entrando nas casas, como se tivessem asas, como se fossem - que coisa! - um milhão de borboletas!
Gabriela então chegou no começo de uma praça.
E quando olhou para cima não achou a menor graça!
Percebeu - calamidade! - que a mentira que ela disse cobria toda a cidade!
Gabriela era levada, era esperta, era ladina, mas, no fundo, Gabriela ainda era uma menina.
Quando viu a trapalhada que ela conseguiu fazer, foi ficando apavorada, sentou-se numa calçada, botou a boca no mundo, num desespero profundo...
Todo mundo em volta dela perguntava o que é que havia.
Por que chora Gabriela?
Por que toda esta agonia?
Gabriela olhou pro céu e renovou a aflição.
E gritou com toda força que tinha no seu pulmão: - Foi mentira! - Foi mentira!
Com as palavras da menina uma nuvem se formou, lá no alto, muito escura, que logo se desmanchou.
Caiu em forma de chuva e as mentiras lavou.
Mas mesmo depois do caso que eu acabei de contar, até hoje Gabriela vive sempre a procurar.
De vez em quando ela encontra um pedaço de mentira.
Então recolhe depressa, antes dela se espalhar.
Porque é como eu lhes dizia.
As coisas que a gente fala, saem da boca da gente e vão voando, voando, correndo sempre pra frente.
Sejam palavras bonitas ou sejam palavras feias; sejam mentira ou verdade ou sejam verdades meias; são sempre muito importantes as coisas que a gente fala.
Aliás, também têm força as coisas que a gente cala.
Ás vezes, importam mais que as coisas que a gente fez...
"Mas isso é uma outra história que fica pra uma outra vez..."

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